Bala de Troco

Numa manhã de terça-feira um rapaz decidiu comprar um chiclete. O motivo? Não sei. Talvez para esconder o mau hálito ou, simplesmente, para ter um pouco de açúcar no organismo. Talvez por que estava a fim? Talvez por que era diabético e estava com hipoglicemia? Nunca saberemos.

- Oi moço, tudo bem? Vê aí um Trident, por favor.

- Ok. Custa 70 centavos.

- Toma 1 real – respondeu o rapaz, surpreso com o baixo preço de um chiclete normalmente supervalorizado.

- Posso te dar o troco em bala?

- Não. Quero os meus 30 centavos.

O baleiro congelou. Ficou branco. Suou frio.

Nunca, mas nunca ninguém havia recusado essa oferta. O contrato social que determinava a bala de troco como forma de escambo informal no lugar de moedas era algo intrínseco na sociedade baleira. Todos os admiradores e consumidores de doces do mundo sabiam que era assim que o negócio funcionava. Era essa a engrenagem que fazia a máquina girar.

Até essa manhã de terça-feira. O pobre baleiro, surpreso, precisava contornar a situação para não quebrar o ciclo microeconômico que fora construído e moldado durante eras a fio.

- Mas por que não? Todo mundo aceita uma bala de troco. São só 30 centavos, você não vai querer sair daqui carregando moedas...

- Sim, eu vou querer. E sabe por quê, nobre senhor baleiro, guardião das balas e quitutes?

- ... Não. Realmente não vejo motivos.

- Me responda: como você comprou essas balas para revenda? Foi com outras balas?

- Não... Foi com dinheiro. Eu compro num atacadão que tem perto da minha cas-

- Então! É por este motivo! Imagina como seria viver num mundo onde a moeda de troca fosse bala! Você consegue imaginar como a moeda seria instável e sujeita a flutuações arbitrárias de câmbio?

- Na verdade eu ach-

- Exatamente! Seria inimaginável! Afinal, como seria a bala de troco nessa economia? Numa situação em que eu comprasse balas de você utilizando balas como moeda, o que você me ofereceria como “bala de troco”? Moedas?

- Eu nunca imaginei por esse lad-

- Pois é! Ninguém imagina! E, além de tudo, imagina como seria feito o pricing das coisas? Você consegue visualizar um anúncio de supermercado na televisão dizendo “Alô você dona de casa, só essa semana: Alcatra, o quilo, por apenas 200 balas Juquinha e 50 Big Big”?

- Pensando bem...

- E trate de pensar! Imagine como a moeda desvalorizaria rápido! Afinal, as pessoas iam literalmente comer o dinheiro nesse modelo econômico. Seria impossível, completamente impossível, o funcionamento de qualquer tipo de banco ou casa de câmbio! A bolsa de valores não poderia medir a variação das ações a partir de deltas de 7 Belo! Os bancos não dispõem de mecanismos de armazenamento e saque de balas! Os caixas eletrônicos seriam, literalmente, aquelas maquininhas de doces, cuja segurança é extremamente falha!

- Acho que você tá cert –

Dois reais na atual taxa de câmbio

- Sim, claro que estou certo! Além de tudo, há o problema dos homônimos. Imagina se ao invés de pagar um lanche feito no Mc Donald’s com alguns pacotes de Halls, a pessoa dá ao atendente um cartucho de metralhadora? Afinal, bala é bala! A legislação precisaria ser bem específica para uma moeda tão ambígua! Fui claro para você, senhor baleiro?

Completamente derrotado, o baleiro assentiu.

- Sim. Foi claríssimo.

- Ótimo. Peço perdão pelo pedantismo, mas precisei provar o meu ponto.

- Posso te dar um Babalu então?

-... Pode.
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1 comentários:

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Leon Dice
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8 de março de 2014 às 23:13 delete

Não esperava pelo final, excelente hahahahahahhahahahahaha

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